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sábado, 10 de outubro de 2015

Cocoricó

Thobias das Dores. Esse era o nome dele, grande amigo dos tempos do colégio. Fomos colegas de aula por 5 anos consecutivos, no (antigo) segundo grau. Éramos uma dupla e tanto: na álgebra, geometria, história, português e principalmente, literatura. Interpretando nas simulações teatrais que fazíamos, Thobias era um artista.

Mas não gostava de ser chamado assim. Na hora da chamada, quando o professor chamava "Thiago", que vinha antes dele, na ordem, o Thobias já antecipava "eu também, presente", na tentativa de que o professor marcasse sua presença sem chamá-lo pelo nome. Na maioria das vezes funcionava, mas o professor de álgebra fazia de propósito: "hum... sim, o Thobias das Dores, está lá... presente, obrigado Thobias". E assim ele ia. Íamos.

Ele gostava mesmo que o chamassem de Bita. Só isso.

Como disse, o Bita era meu amigo. E um artista e tanto. O sonho dele sempre foi ser político. Ele dizia que a carreira pública o atraía pois era fácil para ele e acreditava que tinha a habilidade que um cargo na prefeitura, no governo ou no parlamento exigia. Claro, para quem um dia interpretou Getúlio Vargas (sério, fizemos isso no segundo grau), trabalhar na carreira política seria barbada. Sempre achei que ele seria prefeito, governador, quem sabe até presidente do país. Errei.

Na semana passada eu estava almoçando num restaurante perto do meu trabalho e entra um sujeito esquisito, apressado, vestido de branco, cabelo branco, mas não da idade. Era farinha. Pude ter a certeza quando ele esbarrou numa cliente vestida de preto, que estava servindo do buffet. Espalhou farinha para todos os lados, salpicando com pequenos pontos brancos o casaco preto da cliente perto dele.

Olhei melhor, observei e vi que aquele rosto era conhecido. Entregou alguns pães e discos de pizza para alguém do restaurante e se dirigiu ao caixa. Quando ele disse "são duzentos reais", tive a certeza de que era o Bita. Não me contive, levantei e quando ia perguntar ele se antecipou: "sim, sou eu, o Bita, presente". Obviamente, com medo de alguma coisa, mas acabamos rindo bastante daquele reencontro.

Foi uma grata surpresa para os dois. Perguntei se ele já tinha almoçado e, depois de muita insistência, ele decidiu sentar-se e comer um prato de sopa comigo.

Conversamos por cerca de 40 minutos. Contou-me das suas experiências (inclusive na política) depois do colégio e o motivo de estar hoje vendendo pães nos restaurantes. Depois de um suspiro ele me respondeu resumindo toda a conversa daquele almoço: "olha, existem 4 tipos de galinha. As que não cacarejam, as que cacarejam e põem ovos, as que cacarejam e não põem ovos e as que só cacarejam, com os ovos dela, com os ovos dos outros e mesmo sem ovos. E olha, eu me dei conta que eu sou uma galinha que só põe ovos. Não tenho saco para cacarejar aqui e ali. E por isso decidi abrir uma padaria e pôr ovos todos os dias. Meu negócio é pôr ovo! Entende?".

Isso me faz lembrar a dura vida corporativa de hoje em dia. Muita gente querendo roubar seus ovos e dizer que são delas.

O Bita abriu uma padaria e estava planejando abrir uma filial. O Bita, quem diria, de político, virou empreendedor. E está apenas pondo ovos. Todos os dias.

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Esse é um texto de ficção. Qualquer semelhança com nomes fatos ou acontecimentos, é mera coincidência. Obrigado aos amigos CG e FS.

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